Estávamos num autocarro, a viagem demorava horas, vínhamos do norte para o sul. Por mero acaso sentei-me ao seu lado, pedi para ir do lado da janela porque adoro ver as paisagens, ver o céu, e até mesmo ver as pessoas pelas ruas e ruelas. Tudo bem, tudo ótimo. Viajávamos com o autocarro cheio e era uma festa, com música aos altos berros e com danças estranhas pelos corredores. Eu limitava-me a sorrir e de vez em quando olhava para ele. Numa dessas vezes em que mantinha o meu olhar colado, fui apanhada. Ele não o desviou, nem disse nada. Ficou também a olhar-me. Até que descongelei aquele momento e virei-me para a janela.
Ele começou a falar comigo, fez desabafos e mais desabafos por entre risadas e gargalhadas, parecia que o tempo voava. Até que eu voltei a olhar-lhe daquela forma, da forma em que apreciava cada poro da sua pele, cada pestanejar dos seus olhos e cada pêlo da sua barba. Queria conhecer-lhe melhor. Até que,
"Não olhes assim para mim." Eu apenas perguntei
"Porquê?" e obtive uma resposta que me deixou sem saber o que dizer, e eu sei sempre o que dizer em qualquer situação.
"Porque deixas-me com vontade de te beijar."